Decidido a largar o tráfico no Morro da Pedreira, em Costa Barros, no Rio, o traficante Rodrigo Gomes. pegou uma Kombi lotada em direção à igreja Assembleia de Deus dos Últimos Dias, em São João de Meriti, do pastor Marcos Pereira, que havia abandonado há três meses. No caminho, viu a 39ª DP, pediu para descer da Kombi e entrou.
“Quero me entregar”. Agitado, falando alto, andando de um lado para o outro, com um saco cheio de drogas numa das mãos e um radiotransmissor na outra. Foi assim que Rodrigo Gomes de Oliveira, o Soldado, 24 anos, chegou às 6h de ontem à 39ª DP (Pavuna).
Sob efeito de cocaína, ele implorava por ajuda para tentar largar o vício e o crime. E conseguiu: foi indiciado por tráfico, mas, como se apresentou espontaneamente, não foi preso em flagrante.
Após depor, ele. foi liberado. Mesmo assim, foi aberto um inquérito para apurar o caso. O rapaz foi indiciado por tráfico e associação para o tráfico, devido à grande quantidade de drogas que portava.
Ainda durante o depoimento, Rodrigo. pediu aos policiais para chamarem o pastor Marcos Pereira, da Assembleia de Deus dos Últimos Dias. Assim que soube que o rapaz estava na delegacia, o pastor enviou uma equipe ao local para levá-lo de volta à igreja.
No início da tarde, uma equipe de missionários da Assembleia de Deus dos Últimos Dias o levou à sede da igreja, em São João de Meriti.
A atitude surpreendeu o chefe de investigações da 39ª DP, Marcos Maia. “Nunca vi isso em 25 anos de polícia”, disse ele, que, a pedido do traficante, entrou em contato com auxiliares da igreja do pastor Marcos Pereira da Silva, conhecido por trabalhar na evangelização de traficantes.
Bermuda surrada, tênis velho, sem camisa, Rodrigo contou a sua história de vício. Nascido e criado no Morro da Pedreira, em Costa Barros, ele começou a fumar maconha aos 14 anos, mas demorou a se envolver com a quadrilha local. “Trabalhei quatro anos numa lanchonete e, em agosto de 2004, ingressei na Aeronáutica. O problema é que também me viciei na cocaína”, admite.
Após uma série de indisciplinas, acabou excluído das Forças Armadas. “Fui preso várias vezes por faltar ao serviço. Cheirava cocaína a noite toda, ia ao baile funk e não tinha condições de trabalhar no dia seguinte”, lembrou, jurando jamais ter desviado munição, armas ou ter usado drogas no quartel.
Os R$ 1 mil mensais que recebia na Aeronáutica deixavam Rodrigo deslumbrado. Morando com uma tia e quatro irmãos – ele não conhece o pai, e a mãe vive na Baixada -, não economizou um centavo sequer: “só pensei nas drogas e nas festas. Nunca em mim ou na minha família. Só na cocaína e na zoação”.
Sem dinheiro nem emprego, resolveu trabalhar na boca de fumo. Ficou uma semana como olheiro e, na seguinte, já vendia drogas. E foi assim até a madrugada ontem. “Estava trabalhando lá, vendendo, até que comecei a ver um monte de gente de preto, com binóculo, mira laser, fuzil em cima das lajes da favela, esperando uma invasão. Aí usei mais dois sacolés de R$ 20 e fiquei louco, achando que ia morrer a qualquer momento. Por isso, decidi vir aqui e me entregar para largar tudo isso”, afirmou.
Crime será respondido em liberdade
À 39ª DP, Rodrigo levou cocaína, pedras de crack e trouxinhas de maconha. “Como acreditou no nosso trabalho e se entregou, não entrou em flagrante. Mas vai responder por tráfico e associação para o tráfico”, explicou o delegado Ricardo Nunes Castro.
Antes de voltar à rua, Rodrigo orou com o grupo de evangélicos que foi buscá-lo. Um deles, que se identificou como Álvaro e ficou preso nove anos por tráfico, festejou a decisão: “é preciso que ele valorize a porta que está se abrindo de novo”.
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