João Calvino promoveu o ecumenismo e o ideal comunista bíblico, disse Sergio Arce Martínez, um dos mais proeminentes teólogos protestantes cubanos dos últimos 50 anos.
Como milhões de reformados e presbiterianos em todo mundo, Arce participa do esforço mundial de avaliação da herança calvinista, no marco das celebrações dos 500 anos do nascimento do reformador, natural de Noyon, França.
“Quando analisamos certos momentos na vida e certas reflexões em suas obras, encontramos a idéia de que as igrejas nascidas da Reforma pudessem organizar-se de diferente maneira. Isto é, na perspectiva de Calvino, que não se pode sacralizar de maneira idolátrica uma maneira específica de organizar a igreja, em termos locais ou universais. Isso reflete, em termos eclesiológicos, um aspecto fundamental do espírito ecumênico de Calvino”, assinalou Arce.
O ecumenismo de Calvino ultrapassou o estritamente eclesial porque foi multicultural, agregou Arce. “Durante seu ministério pastoral, Genebra foi uma cidade na qual confluíram centenas de crentes de todas as nacionalidades européias, procurando refúgio, de diferentes culturas e experiências religiosas”.
Foi durante sua estada em Estrasburgo que Calvino recebeu a influência ecumênica de outro reformador, Martín Bucero, que considerava como meta de sua vida lutar para que fossem vencidas todas as diferenças que dividiam as diferentes tradições reformadoras naquele momento histórico, rico em diversas tendências eclesiológicas e teológicas.
Um exemplo concreto dessa atitude ecumênica de Calvino foi seu encontro com Heinrich Bollinger, em 1549, para atingir o que se chamou o Consenso de Zurique, um passo decisivo na forja da unidade de todas as igrejas suíças, tanto de fala alemã como francesa.
Mas também devem destacar-se, insistiu Arce, suas relações com o movimento hussita — a Comunidade dos Irmãos Checos —, seu desejo de manter uma relação mais estreita com os luteranos, a ponto de poder atingir uma verdadeira unidade eclesial e sua fluída correspondência com os arcebispos ingleses Cranmer e Parker, e com o secretário de Estado da Rainha Elizabeth em seu desejo de relacionar-se mais intimamente com a Igreja Anglicana. Sem esquecer seu auxílio exemplar aos valdenses no meio de suas graves dificuldades quando foram declarados hereges e perseguidos pela Igreja Católica Romana.
Mas além de ser ecumênico, o reformador — a quem não poucos atribuíram a “paternidade” ideológica do capitalismo— foi um paladino de idéias que podem qualificar-se de comunistas, afirmou Arce.
“Quantos dores e dissabores poderiam sido poupados na História, se suas pretensos seguidores tivessem prestado ouvidos a sua maneira comunista de pensar e de atuar, quando propugnava que fosse uma realidade sócio-político-econômica o princípio comunista: ‘De cada qual segundo suas capacidades e para cada qual segundo suas necessidades!’”, esclareceu o teólogo cubano.
Na opinião dele, “uma grande parte dos chamados calvinistas, pretensamente seguidores do pensamento de Calvino, desentenderam-se por razões nada espirituais, e muito menos cristãs, do que comentava Calvino sobre a passagem do apóstolo Paulo em II Coríntios 8:13-15:
“‘Deus quer que tenha tal analogia e igualdade entre nós, que cada qual tenha de fornecer aos que têm menos, segundo esteja a seu alcance, a fim de que alguns não tenham em demasía e outros estejam em apuros’”.
Arce destaca que esta idéia foi parte essencial do ensinamento de Calvino, segundo se lê textualmente em seu “Comentário sobre a Segunda Carta aos Coríntios”, que consta em seu “Comentário ao Novo Testamento”, editado em francês em 1561.
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