Após reação da Igreja, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou revisão do trecho que defende o aborto no decreto (assinado por ele) que instituiu o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, alegando que o texto não traduz a posição do governo. Haverá alteração ainda no trecho sobre a apuração de excessos praticados na ditadura.
Pela nova redação, o documento deverá manifestar uma defesa genérica do aborto, exclusivamente dentro dos limites estabelecidos por Lula nos seus discursos: no contexto de saúde pública -para salvar a vida da mãe, por exemplo. As críticas ao documento devem, portanto, se deslocar da área religiosa para as entidades ligadas às questões da mulher.
Como foi publicado pelo “Diário Oficial da União”, no dia 22 de dezembro, o plano estabelece “apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos”.
Na nova redação, será suprimida a parte que fala da autonomia, pois caracteriza apoio à decisão íntima de interromper a gestação, mas não é a posição do governo e de Lula.
Em discurso pelo Dia Internacional da Mulher, em março de 2009, ele declarou ser, “como cristão, contra o aborto”. A legislação atual só permite o aborto, desde que praticado por médico, nos casos de estupro ou de risco de morte da mãe. Nos demais casos, a gestante que aborta pode ser punida com detenção de até três anos, e o médico ou outra pessoa que provoque o aborto pode ter pena de reclusão de até 20 anos.
Em reunião ontem, Lula disse querer “resolver isso logo” porque a polêmica sobre o caso foi grande e desproporcional.
A revisão do documento está sob responsabilidade da Casa Civil, chefiada por Dilma Rousseff. Ela está sendo poupada dos debates sobre o plano.
A origem da principal polêmica é a criação da comissão da verdade, na diretriz 23, que colocou em lados opostos o Ministério da Defesa e a Secretaria de Direitos Humanos, que fez a redação final do plano.
Uma fórmula considerada de meio-termo seria mudar a parte em que o plano determina investigações de violações de direitos humanos cometidas pela “repressão política”, que significa apurar só os crimes de tortura e morte cometidos pelos agentes do Estado.
A expressão seria suprimida, deixando que um projeto de lei enviado ao Congresso especificasse os alvos da apuração.
A Casa Civil ainda analisa a viabilidade dessa forma, enquanto Lula chama Nelson Jobim (Defesa) e Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) para conversar entre hoje e amanhã para chegar a um consenso.
Para o governo, a questão é, no fundo, de ordem semântica.
A revisão promovida pela Casa Civil abrange a questão do aborto e da comissão da verdade, mas não contempla polêmicas levantadas por ruralistas e de direito à informação. Na versão do Planalto, o ministro Reinhold Stephanes (Agricultura) só reclamou do texto “para satisfazer a sua base eleitoral”.
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