Agora que tento examinar e interpretar, em retrospectiva, a viagem à Coréia do Norte, não sei por onde começar. Uma visita à Coréia do Norte é como um filme surrealista. Vi muita coisa, mas o que realmente vi? Isso não acrescenta muito, mas como descrever de forma compreensível aos que não estiveram lá?
Algo está muito claro: inegavelmente, há muita coisa acontecendo na Coréia do Norte. Em uma tentativa de reunir minhas observações e minha análise, diria que a Coréia do Norte é fechada, todavia a fechadura da porta começa a falhar e, algumas vezes, deixam a porta entreaberta.
Movimentação restrita
"Fechada" é um termo moderado para descrever a realidade que continua temível e totalitária. De forma objetiva e tangível, o país está fisicamente fechado. Como visitante, você percebe isso na chegada: é difícil conseguir visto, atravessar a fronteira demora muito e há muitos trâmites burocráticos. É quase impossível se movimentar livremente pelo país; a supervisão, que se disfarça com a presença de um guia, é constante.
Contudo, essas restrições físicas são muito mais dramáticas para os habitantes, e apenas a elite viaja pelo próprio país. Pyongyang, como capital da elite, é uma fortaleza inexpugnável para os norte-coreanos da área rural. Os "animais sem cauda" (os prisioneiros de campos de concentração) sofrem o confinamento físico mais terrível, e, em geral, não se fala sobre a existência disso no país. No entanto, sabemos disso, por exemplo, por meio de relatos de Soon Ok Lee. Estes são os proscritos do sistema norte-coreano.
Bloqueio econômico
A economia também é bloqueada. Vemos isso no estado deplorável das rodovias e estradas de ferro, nos monumentos públicos, nos ônibus, trens e bondes, na total falta de manutenção dos edifícios e no método arcaico de agricultura. E isso é algo doloroso em um país que tem um potencial de riqueza tão grande e uma população com um espírito muito competitivo, além de ser cultural e historicamente muito talentosa.
A Coréia do Norte não é um país pobre apenas no sentido literal. É um país que sofre de total má administração e ineficiência desconcertante. Isso significa que a Coréia do Norte está fisicamente fechada, presa em uma ideologia totalitária destrutiva.
Confinamento psicológico
O confinamento psicológico é menos objetivo, mas não menos real. A forma "juche" de pensar que, em síntese, personifica a superioridade e a autonomia absolutas da nação coreana e a absoluta adoração do homem e suas realizações são catalisadas na liderança absolutista, em um sentido intelectual, prático e moral, do amado "eterno" presidente Kim Il Sung, e o líder atual, seu filho Kim Jong Il. Com a influência do pensamento "juche", o pai morto e o filho mantêm a Coréia do Norte com garras paralisantes.
O pensamento "juche"não é apenas um conjunto de fatos que são considerados verdades, mas também, e principalmente, uma forma de pensar totalitária, uma doutrina. As crianças são criadas nesse sistema, e os adultos doutrinados com informações que são apresentadas como verdades, e estas são reiteradas ao longo da vida. Percebemos isso constantemente nos comentários dos guias de monumentos e de museus.
As informações estatísticas são apresentadas de forma impecável: tamanhos, pesos, datas, citações do líder. No entanto, qualquer reflexão, análise e síntese são formas de pensamento não praticadas pelo povo da Coréia do Norte. O resultado é que a forma de pensar ocidental, ou o modo de se iniciar uma conversa ("O que você pensa sobre...?", ou algo até mais pessoal: "Como você se sente sobre...?"), causa problemas de comunicação intransponíveis. Dessa forma, a Coréia do Norte está psicologicamente aprisionada e, de forma geral, é incapaz de reavaliar os antigos pontos de vista com base em novas informações para chegar a novas conclusões.
O isolamento em relação à informação que existe há mais de meio século (a mídia é totalmente controlada) põe os norte-coreanos em um tipo de quarentena involuntária, inconsciente. Soa bastante estranho quando os guias apresentam de forma objetiva informações incorretas.
Isso torna vulnerável a interação livre com os norte-coreanos; afinal, quem somos nós para confrontá-los com a ignorância de que estão inconscientes e pô-los em uma posição difícil? Sob o aspecto humano, isso também torna a aceitação do evangelho algo extremamente difícil. No entanto, sabemos e acreditamos que o Espírito de Deus transcende os limites e as fronteiras impostos pelos homens!
Espiritualmente fechados
O país não é fechado apenas física e psicologicamente. O mais angustiante é que os norte-coreanos não são livres para crer no que querem. O principal e mais assustador é que o país também é fechado espiritualmente. Revela-se a extensão do sistema totalitário pela prisão e pela condenação à morte de muitos cristãos no país. Encorajam as crianças, em obediência ao "Grande Líder", a relatar quando vêem seus pais lendo um certo livro preto (a Bíblia) em casa e/ou orando. Encontros de fiéis são proibidos, além de serem fatalmente perigosos. O mesmo se aplica ao fato de possuir uma Bíblia ou de escutar um rádio que não esteja na estação controlada pelo Estado.
Na Coréia do Norte, há cristãos que não se ajoelharam para Baal. O antigo e reverente epíteto para Pyongyang, a "Jerusalém do Oriente", ainda não está totalmente desvanecido, e acreditamos firmemente que ganhará força de novo. A extensão da batalha espiritual no Reino celestial revela-se pelo crescimento tênue da presença da igreja, a presença e penetração de colaboradores da seita Moon (muito ativa a partir da Coréia do Sul) e a crescente influência da, assim chamada, religião tradicional, o budismo. Revela-se no fato de que o nome de Jesus - que nos é dado como a Verdade (absoluta), o Caminho e a Vida - é o único nome na Coréia do Norte que leva à execução imediata ou à detenção em um campo de concentração. E embora objetivamente pareça que haja espaço na doutrina para outras heresias,uma prova indireta da integridade do evangelho, pois Deus está presente em sua Palavra.
As fechaduras rangem
A Coréia do Norte, ou como os guias preferem se referir ao país, o DPRK, República Democrática Popular da Coréia ("somos um povo, uma nação") é uma prisão. O país está fechado física, psicológica e espiritualmente. Contudo, há sinais de esperança. As fechaduras rangem e já deixam a porta entreaberta.
Em nossa chegada ao país, os guias não pronunciaram um tributo a Kim, ao "juche" ou ao país nem nos deram as instruções comuns que deveríamos seguir durante nossa visita (embora não permitissem que tirássemos fotografias que retratassem a pobreza). Ao contrário, os guias eram bem relaxados, faziam brincadeiras e deram bastante espaço para contato com o povo. Está diminuindo a presença dominante de retratos do pai e do filho, Kim, nas ruas e nos prédios. Em muitos lugares, os retratos foram até removidos.
Ao passo que há poucos anos, na rua, as pessoas não levantavam os olhos e não reagiam a cumprimentos ou acenos, agora elas, freqüentemente, respondem e parecem relaxadas. É evidente que as pessoas temem se expressar e fazer contato.
Cresce a agressividade das polícias de fronteira norte-coreana e chinesa, um sinal óbvio e patente de aumento de tensão no mundo espiritual.
Pela primeira vez, o regime pediu auxílio externo por causa da terrível inundação que houve em meados de julho. Embora os guias relatem que houve poucos milhares de vítimas, algumas organizações afirmam que houve centenas de milhares de vítimas fatais. Todos os jogos de massa desse ano foram cancelados.
Vale a pena visitar a Coréia do Norte. Se alguém pode trazer libertação para esse país fechado é o Senhor Deus. É bastante surpreendente que ele nos use, pessoas de carne e osso, sem valor e tão vulneráveis quanto os iludidos norte-coreanos, para ficar na brecha por eles, para orar e para testificar.
Os cristãos que visitam a Coréia do Norte, ao ver e ao ouvir os cristãos de lá louvar e orar, comprovam a fidelidade e o amor de Deus por todos. E desde a queda de Jericó, sabemos que as orações, o andar e os vivas do povo fiel precederam o colapso dos muros da cidade. Que Deus, ajudado por nossa obediência e fidelidade, conceda que os muros da prisão da Coréia do Norte também caiam logo.
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