As religiões neopentecostais ganharam terreno no Brasil nos últimos anos, mas o que pode estar por trás disso são as estratégias agressivas de persuasão de algumas de suas igrejas. No entanto, o que alimenta a necessidade de “marketing da fé” pode ser um dos maiores concorrentes de todas as religiões: a ciência.
A análise é do sociólogo Antônio Flávio Pierucci, da Universidade de São Paulo (USP), que apresentou nesta terça-feira (10/9) a conferência “Novos números sobre as religiões no Brasil”, na 59ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em Belém.
Segundo Pierucci, as religiões mostram uma forte concorrência entre elas e os evangélicos estão ganhando terreno, mas a aceleração desse crescimento está se atenuando. As principais razões: as privações exigidas pelas religiões e os avanços da medicina.
“O hedonismo – isto é, a busca de prazeres – e a ciência, sobretudo as áreas ligadas à saúde, são os principais adversários das religiões como um todo. A adesão às religiões está chegando num teto”, disse Pierucci à Agência FAPESP.
Para o professor, o marketing religioso explica a expansão evangélica, mas que já está chegando ao limite. “É difícil convencer as pessoas de que devem abdicar dos prazeres da vida. Além disso, quando você sente uma dor no peito no meio da madrugada, acaba indo ao médico e não ao templo”, disse.
Para fazer a análise, que ainda não tem data para publicação, Pierucci comparou dados sobre religião do Censo de 2000 e dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) de 2003, com projeção para 2007, ambos realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com o professor, entre 2000 e 2007, a porcentagem de católicos no Brasil se manteve a mesma: quase 74%. Enquanto isso, a porcentagem de evangélicos cresceu de 15,4% para quase 18%. No mesmo período, a porcentagem dos “sem-religião” foi reduzida de 7,2% para 5,4%.
“Esse dado me surpreendeu muito. Os que se declaram sem religião vinham aumentando desde a década de 1980 até o fim da seguinte. Aparentemente, muitos deles passaram à fé evangélica pentecostal. É uma pena, pois geralmente a adesão às religiões está ligada aos insucessos na vida”, destacou.
A redução do número de “sem-religião” se deveria à estratégia agressiva de divulgação e persuasão de algumas igrejas pentecostais, segundo Pierucci. “A religião, para sobreviver, percebe que não pode competir com a ciência. Por isso, ela acirra suas estratégias de persuasão e tenta fazer marketing de si mesma. Com isso, apenas as religiões mais agressivas em termos de proselitismo conseguem ganhar mais fiéis”, disse.
Os evangélicos ganharam espaço em relação aos católicos, de acordo com o professor, porque cada novo fiel se sente como um “missionário enviado para tirar seus semelhantes do mal”.
“Os evangélicos vão à luta. As religiões protestantes, da mesma forma que o islamismo, são as maiores predadoras de rebanhos de outras crenças. Mas nas igrejas protestantes tradicionais esse ímpeto se atenuou com o tempo. Os pentecostais, no entanto, estão em pleno esforço de marketing religioso. São religiões muito pró-ativas”, afirmou Pierucci.
O crescimento evangélico não impede o enfraquecimento das religiões, de acordo com o sociólogo. “Hoje, o excesso de marketing religioso é em si mesmo uma demonstração de que a religião não anda tão bem das pernas.”
Segundo Pierucci, uma pesquisa feita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil identificou que muitos dos indivíduos que dizem não ter religião não estão querendo dizer que são ateus. Boa parte diz que não tem religião por falta de tempo, por não poder se dedicar, e isso explicaria as oscilações entre os sem-religião.
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